quarta-feira, 11 de setembro de 2013

11 DE SETEMBRO - CRÓNICA DE UMA PILOTO DE F-16 (M1150 - 251PM/2013)

Um F-16C da base de Andrews da ANG com armamento inerte    Foto:USAF

Ao fim da manhã da terça-feira que mudou o mundo, a Ten. Heather "Lucky" Penney estava na pista da Base Aérea de Andrews pronta para descolar. Tinha a mão na manete de potência do seu F-16 e tinha ordens: abater o voo 93 da United Airlines. O quarto avião pirateado do dia parecia dirigir-se a Washington. A Penney, uma dos dois primeiros pilotos de combate no ar nessa manhã, foi-lhe ordenado que o detivesse.

O que ela não tinha, enquanto desaparecia com um rugido no céu cristalino, eram munições reais. Ou mísseis. Ou qualquer outra coisa com que atirar a uma aeronave hostil.
À exceção do seu próprio avião. Era esse o plano.

Como os ataques surpresa se iam desenrolando, naqueles tempos inocentes, mais depressa do que era possível armar aviões de combate, Penney e o seu comandante subiram no céu, direitos ao Boeing 757. "Não íamos disparar contra eles.  Íamos abalroar o avião" relembra Penney acerca da ordem desse dia. "Basicamente eu seria um piloto kamikaze".

Durante anos, Penney, pertencente à primeira geração de mulheres pilotos de caça no país, não concedeu entrevistas sobre a sua experiência no dia 11 de setembro de 2001 (que incluiu escoltar o Air Force One de volta até ao espaço aéreo então subitamente protegido de Washington). Mas dez anos mais tarde, reflete numa das histórias menos contadas dessa imensamente dissecada manhã: em que medida os primeiros contra-ataques preparados pelos militares americanos eram efetivamente missões suicida.

"Tínhamos de proteger o espaço aéreo de todos os modos que pudéssemos" disse na semana passada, no seu gabinete na Lockheed Martin, onde é agora diretora no programa F-35.

Penney, agora Major, mas ainda assim uma pequena loira com um sorriso Colgate, já não é piloto de combate. Fez duas comissões no Iraque e pertence ainda à Guarda Aérea Nacional  (ANG) a tempo parcial, fazendo maioritariamente voos com VIPs num Gulfstream. E pega nos comandos do seu próprio histórico Taylorcraft de 1941 sempre que pode.

Mas nenhuma das suas milhares de horas de voo se compara com a adrenalina de se lançar naquilo que era suposto ser uma viagem de sentido único para uma colisão no ar.

Os F-16 do 121 FS em Andrews, Washington DC     Foto:USAF

Em 2001, Penney era uma novata e a primeira mulher a pilotar um F-16 na Esquadra 121 da ANG em Washington DC. Tinha crescido a cheirar combustível de jatos. O seu pai havia voado jatos no Vietname e ainda voava neles. Obteve o brevet de pilotagem quando era estudante de literatura. Planeava ser professora. Mas durante o último ano, o Congresso abriu a aviação de combate às mulheres e Penney estava na primeira linha.

"Alistei-me imediatamente" diz. "Queria ser piloto de combate como o meu pai".

Naquela terça-feira, tinha terminado duas semanas de treino de combate no Nevada. Estava sentada com os camaradas à volta da mesa de briefing, quando alguém entrou para dizer que um avião tinha colidido com o World Trade Center em Nova Iorque. À primeira, assumiram que teria sido algum louco num Cessna. Mas quando aconteceu novamente, souberam então que era guerra.

Mas a surpresa era completa. Na confusão monumental daquelas primeiras horas, era impossível haver ordens claras. Nada estava pronto. Os caças ainda estavam equipados com balas inertes das missões de treino. Por estranho que pareça agora, não havia aviões armados de prontidão, nem sistema de alerta para os lançar sobre Washington. Antes daquela manhã, todos os olhos estavam ainda virados para o exterior, procurando os padrões de ameaça da Guerra Fria, de aviões e mísseis vindos do círculo polar.

"Não havia ameaças percetíveis naquele tempo, especialmente uma vinda de dentro do próprio país" diz o Cor. George Degnon, vice-comandante da Ala 113 de Andrews. "Havia um sentimento de impotência, mas fizemos tudo o que era humanamente possível, para colocar os aviões armados e no ar. Foi fabuloso ver as pessoas a reagir".

As coisas são diferentes hoje em dia, diz Degnon. Pelo menos dois aviões com munição real estão de prontidão a toda a hora, e os pilotos não se afastam mais do que alguns metros do cockpit.

Um terceiro avião colidiu com o Pentágono e quase imediatamente veio a informação de que um quarto avião poderia estar a caminho, ou até mais. Os caças estariam armados dentro de uma hora, mas alguém teria que ir para o ar imediatamente, com ou sem armamento.

"Lucky, tu vens comigo" berrou o Cor. Marc Sasseville.
Preparavam-se na zona de equipamentos quando Sasseville em luta com o seu fato de voo, cruzou o olhar com ela. "Eu vou para o cockpit" disse Sasseville. Ela replicou sem hesitação: "sigo atrás de si".
Era um plano. E um pacto.

Penney nunca tinha feito um alerta num caça. Normalmente a fase pré-voo leva uma meia hora de inspeções metódicas. Começou imediatamente a percorrer a lista. "Lucky o que fazes? Mete-te lá dentro e vamos embora!" gritou Sasseville.

Mecânicos em volta de um F-16 em Andrews   Foto: Sumeana Leslie/USAF

Ela subiu, apressou-se a ligar o motor e berrou aos mecânicos para tirarem os calços das rodas. O crew chief ainda tinha o cabo do headset ligado ao avião e já ela dava potência ao motor. O crew chief foi correndo, a tirar pins de segurança do avião, enquanto este seguia em frente. Ela murmurou uma oração de piloto de caça - "Deus, não me deixes fo##r isto!" - e seguiu atrás de Sasseville para os céus.

Passaram sobre um letárgico Pentágono, em direção ao noroeste, a mais de 400 mph (cerca de 640 km/h), voando baixo e perscrutando o nítido horizonte. O seu comandante, tinha tido tempo de pensar no melhor sítio onde atingir o inimigo: "Nós não treinamos para abater aviões de linha aérea" disse Sasseville, agora a trabalhar no Pentágno. "Se acertássemos só num motor, ainda podiam planar até atingir um alvo. Tinha pensado em atingir o cockpit ou uma asa."
Tinha pensado também na sua cadeira ejetável. Será que haveria tempo mesmo antes do impacto? 
"Esperava fazer as duas coisas ao mesmo tempo", diz. "Provavelmente não iria resultar, mas era o que eu tencionava fazer."

Penney preocupava-se se iria falhar o alvo, ao tentar ejetar-se: "Se te ejetares e o teu avião passar sem colidir..."  diz com a voz a desvanecer com a ideia de falhar, mais aterradora do que a própria morte.

Mas não foi preciso morrer. Não teve que deitar abaixo um avião cheio de crianças, vendedores e namoradas. Eles mesmos fizeram isso.
Haveriam de passar horas, antes que Penney e Sasseville soubessem que o voo 93 da United tinha caído na Pensilvânia, depois duma revolta dos reféns, dispostos a fazer o que os dois pilotos da ANG estavam também dispostos a fazer: nada e tudo.

"Os verdadeiros heróis foram os passageiros do voo 93, que se dispuseram a sacrificar-se a eles próprios", diz Penney. "Eu fui apenas uma testemunha acidental para a história."

Ela e Sasseville voaram durante o resto do dia, desimpedindo o espaço aéreo, escoltando o Presidente, vigiando de cima a cidade que os enviaria para a guerra.

Hoje, é mãe solteira de duas meninas. Ainda adora voar. E pensa muitas vezes naquela extraordinária viagem pela pista adiante há uma década atrás:"Acreditei verdadeiramente que seria a minha última descolagem" diz. "Se fizéssemos as coisas bem, seria mesmo".

Fonte: Washington Post
Tradução e adaptação: Pássaro de Ferro



2 Comentários:

Márcio Sousa disse...

Os EUA sem nenhum caça armado e pronto a descolar em minutos, é quase impensável, mas realmente não havia a prontidão de hoje em dia, e deve se muito ao 1 de Setembro.
Mais um bom post do pássaro de ferro, continuem. abraço.

Márcio Sousa disse...

Os EUA sem nenhum caça armado e pronto a descolar em minutos, é quase impensável, mas realmente não havia a prontidão de hoje em dia, e deve se muito ao 11 de Setembro.
Mais um bom post do pássaro de ferro, continuem. abraço.

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