sábado, 7 de setembro de 2024

AVENTURAS E DESVENTURAS DE UM INSTRUTOR DA RAF - Episódio I [M2525 - 69/2024]

 RAF Valley, Anglesey, País de Gales, Verão de 1973 (Episódio 1)

“Depois de um curso no (Folland) Gnat iniciei o meu trabalho como instrutor no “No 4 Flying Training School” em Anglesey em 1973.  Assim que terminei o breve check-out de aptidões deixaram-se á solta com os alunos e o que me impressionou de imediato foi a disparidade de talento entre eles.  Comparando com os meus tempos de instrução, alguns eram maus (piores do que eu) enquanto outros estavam muito melhor preparados.  Num dos meus primeiros voos, um exercício de navegação a baixa altitude, o meu aluno desceu e desceu até nivelar a apenas 15 metros de altitude sobre um lago.  Ele sabia (e eu também) que o limite do exercício era 75 metros, por isso perguntei-lhe se sabia a que altitude estava.  Sem hesitar respondeu; “15 metros, sir”.  Como não encontrei nenhuma resposta inteligente limitei-me a instrui-lo a regressar á altitude mínima.  Apesar de necessitar de alguns ajustes, ele estava totalmente confiante com o avião e com a navegação a baixa altitude - melhor do que eu, para dizer a verdade.  Mas outros alunos… não conseguiam encontrar o próprio rabo com as duas mãos e um mapa!  Era vital estar sempre em cima deles e confirmar tudo o que mexiam, senão corríamos o sério risco de nos espetarmos contra o cenário á mínima distracção.” 

A base aérea em Valley é um dos locais mais associados ao treino avançado de pilotos da RAF.  Nas décadas de 70 e 80 os Folland Gnat e Hawker Hunter cruzavam os céus desta bela região do País de Gales.  Hoje, os BAe Hawk e Beechcraft Texan continuam a desempenhar o mesmo trabalho com a mesma dedicação.

“O voo em formação também podia ser angustiante para alunos inexperientes.  Esse tipo de voos era feito geralmente em grupos de três, com um instrutor líder (com um aluno) na frente e um aluno – com ou sem instrutor – em cada asa.  Quanto me preparava para um destes exercícios, o instrutor líder chamou-me ao lado, apontou para o meu aluno e disse-me baixinho “cuidado com este”.  Depois de ler as notas sobre o sujeito em particular comecei a ficar nervoso…  Aterrorizado, observei o rapazola atentamente enquanto tratava dos procedimentos pré-descolagem e durante o trajecto até á pista.  Ele parecia saber o que estava a fazer, por isso relaxei um pouco.  No entanto, assim que descolamos percebi que havia um problema – ele lidava com o manche como uma raquete de ténis!  “Meu Deus”, pensei, “se calhar está nervoso por causa do exercício de formação”.  Quanto mais nos aproximávamos do avião líder, mais selvagens eram as oscilações laterais e, com receio pela nossa segurança, assumi o controlo e disse-lhe para se acalmar.  Hoje sei, devido aos meus dolorosos esforços para aprender golfe, que a pior coisa que se pode dizer a alguém que está atrapalhado e em stress é; “tem calma”, mas, na altura, não sabia o que mais lhe dizer.  De qualquer forma, deixei-o tentar novamente mas rapidamente começaram os movimentos bruscos e erráticos.  Não podia ser, pensei.  Acabei por completar eu o exercício simplesmente para evitar o perigo de colisão.  Acho que ele acabou por completar o curso com sucesso, mas espero sinceramente que seja numa função que não exija voo em formação ou reabastecimento em voo.”

O Folland Gnat marcou uma geração de pilotos.  Ágil e muito rápido, era também um aparelho que, conforme as palavras do narrador, o Tenente Stewart Gosling, exigia ser tratado com cuidado e respeito.

“No outro extremo do espectro lidei com um aluno, com quem trabalhei mais tarde nos Lightning e nos Phantom, que me fazia sentir como um verdadeiro amador.  Ele tinha um dom natural para pilotar e veio a tornar-se um excelente piloto de caça.  Um dia estávamos a praticar um exercício que consistia em abandonar a formação, afastarmo-nos cerca de 1 quilómetro, e recuperar a posição certa na formação o mais rapidamente possível – e em segurança.  Bem, este rapaz disparava em direcção ao resto da formação ao dobro da velocidade recomendada, passava o ponto onde eu já estaria a usar o travão aerodinâmico há muito tempo e, quando a manobra parecia totalmente perdida, ele cortava a potência bruscamente, accionava o travão e estancava o avião no lugar exacto.  Não disse nada porque eu não conseguiria fazer aquela manobra, por isso pedi-lhe que a repetisse um par de vezes - sempre com o mesmo resultado.  Bom, só espero que ele não conduza assim na estrada…”   

Um Gnat a serpentear entre o tráfego da auto-estrada A5, que liga Londres ao Norte do País de Gales.  Este tipo de “exercício” era particularmente entusiasmante e muito popular entre os instrutores da RAF mas, caso as chefias perguntem… nunca aconteceu.

Texto e seleção de imagens: Icterio
Edição: Pássaro de Ferro


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